No mês em que acontece a Nona edição da Campanha dos 21 Dias de Ativismo Contra o Racismo, o Fundo Agbara convida parceiros, apoiadores e toda a sociedade a reconhecer o papel estratégico e histórico das organizações negras na transformação social do Brasil. Em um país marcado por desigualdades estruturais profundas, as organizações negras lideram iniciativas que constroem alternativas concretas para a superação do racismo e de todas as formas de opressão e são protagonistas de resistência histórica.
A partir do diagnóstico “Filantropia e Raça no Brasil”, realizado pelo Núcleo de Pesquisa e Memória das Mulheres Negras (NUPEMN) do Fundo, foi possível evidenciar, com dados e narrativas, a relevância das organizações negras na defesa de direitos, na mobilização de territórios e no fortalecimento comunitário em todo o país. Suas ações têm um papel central na promoção da equidade racial, impulsionando mudanças estruturais que confrontam o racismo sistêmico e as injustiças sociais.

Quem são as organizações negras e por que são fundamentais?
As organizações negras no Brasil são resultado direto da luta histórica do movimento negro, que há décadas atua de forma autônoma e coletiva para enfrentar o racismo em suas distintas dimensões e promover justiça social. Ao longo do tempo, essas organizações não apenas resistiram, mas também se reinventaram diante dos desafios impostos à população negra.
Dados da pesquisa:
- Foram mapeadas 834 organizações negras, atuando em todas as regiões do país, com destaque para 45,6% no Nordeste e 23,6% no Norte, evidenciando forte atuação fora do eixo tradicional dos recursos.
- 89,2% das organizações são lideradas por mulheres, reforçando o protagonismo feminino negro.
- 41,1% possuem 10 anos ou mais de atuação, demonstrando continuidade e impacto a longo prazo.
- 21,7% têm mais de duas décadas de existência, reforçando sua relevância histórica.
- 22,1% das organizações foram criadas entre 2 a 4 anos atrás, especialmente durante a pandemia de Covid-19, momento em que as desigualdades sociais se agravaram com o abandono estatal sobretudo para as populações negras e periféricas, muitas iniciativas surgiram para garantir a sobrevivência em seus territórios.
Quais territórios e comunidades essas organizações mobilizam?
As organizações negras atuam diretamente nos territórios mais afetados pelo racismo estrutural e ambiental no Brasil, garantindo que suas ações estejam conectadas às realidades e necessidades das populações historicamente vulnerabilizadas.

Sua atuação se fortalece porque reconhece as lutas desses territórios, que, embora distintas em suas especificidades culturais e históricas, compartilham desafios comuns, como a defesa da terra, da ancestralidade, do direito ao território e da proteção das formas de existência. Essas organizações mobilizam redes de solidariedade e apoio mútuo, operando na linha de frente da defesa de direitos, da soberania dos territórios e da promoção da justiça ambiental e climática.
Dados da pesquisa:
- 84,5% estão presentes em territórios periféricos, comunidades e favelas, enfrentando desigualdades estruturais nas grandes cidades e promovendo segurança alimentar, saúde, educação, cultura, entre outros.
- 95,3% das organizações desenvolvem práticas de solidariedade, como doações de alimentos, mutirões e ações humanitárias essenciais para enfrentar as desigualdades socioeconômicas.
- 42,6% atuam em territórios quilombolas e 37,6% em comunidades tradicionais de matriz africana, preservando saberes, práticas culturais e formas de resistência negra.
Em quais áreas essas organizações atuam?
A diversidade de atuação das organizações negras reflete a interseccionalidade de suas pautas. Suas ações reafirmam que a luta antirracista passa pela valorização das identidades negras e pela reivindicação de direitos políticos e sociais. Essas organizações operam em áreas essenciais para o desenvolvimento social e para a formação de cidadãos mais conscientes e engajados.
Dados da pesquisa:
- 89,3% caracteriza-se pela atuação em mais de uma área estratégica.
- Cultura (71,2%) – Fortalecimento da identidade negra, preservação de memórias e valorização da produção artística afro-brasileira.
- Educação (60,1%) – Atuação em políticas educacionais, acesso ao ensino superior e promoção de educação antirracista.
- Direitos Humanos (51%) – Defesa de direitos civis, combate à violência racial e luta por justiça social.
Além disso, destaca-se as frentes de atuação, voltadas à luta por direitos de grupos vulnerabilizados e por políticas públicas direcionadas à garantia dos direitos sociais básicos, tais como:
Dados da pesquisa:
- Comunicação (32,8%) – Produção de narrativas negras, enfrentamento da desinformação e fortalecimento da mídia independente.
- Gênero e sexualidade (29,7%) – Combate das discriminações, violências e injustiças que afetam pessoas com base em seu gênero, orientação sexual ou identidade de gênero.
- Saúde (28,1%) – Promoção de políticas de saúde voltadas para a população negra e combate ao racismo institucional no atendimento médico.
Por que fortalecer o ativismo negro e suas organizações?
O ativismo negro no Brasil sempre esteve no centro das lutas por liberdade, cidadania e direitos. Foram centrais para a consolidação da Constituição de 1988, o que demonstra a relevância para a democracia e garantia de direitos que não beneficiam somente pessoas negras, mas a sociedade como um todo. Hoje, as organizações negras seguem cumprindo esse papel e também projetam alternativas concretas para o futuro, fundamentadas na justiça racial.

No mês que ocorre os 21 Dias de Ativismo Contra o Racismo, reforçamos que não existe combate ao racismo sem o protagonismo das organizações negras. São elas que mobilizam territórios, constroem redes, promovem o debate público, realizam incidência política, protegem vidas e geram mudanças que atravessam o cotidiano e as estruturas institucionais.
Fortalecer essas organizações é fortalecer a sociedade antirracista que queremos e precisamos construir. O Fundo Agbara celebra essa potência, reconhece essas lideranças e segue junto, valorizando as trajetórias que tornam possível um Brasil mais justo, plural e digno.
SAIBA MAIS
Para aprofundar essa discussão, acesse o Diagnóstico acerca de Filantropia e Raça no Brasil, que apresenta dados inéditos sobre as organizações negras no Brasil, sua transformação social e os desafios que ainda precisam ser superados.
EM CAMPO
A produção de conhecimento no Fundo Agbara está lado a lado com a incidência política no campo do financiamento e da política institucional, assim como comprometida com a democratização das informações para as organizações da sociedade civil e a população como um todo.
Iniciamos nossa estratégia de lançamento internacional nos Estados Unidos. Passamos pela cidade de San Francisco e New York onde construímos espaços de diálogos com outros fundos colaborativos, doadores, lideranças e organizações da sociedade civil.
Em 11 de março de 2025, compondo a agenda da 69ª sessão da Comissão sobre a Situação da Mulher (CSW) das Nações Unidas, em parceria com o Instituto Marielle Franco, Criola e Conectas, realizamos o evento paralelo “O Papel das Mulheres Negras na Defesa da Democracia” no qual debatemos o papel e a atuação das mulheres negras na manutenção do sistema democrático na América Latina, com foco em desafios, oportunidades e estratégias para aumentar sua participação política.
A mesa de mulheres negras contou com a participação de Lúcia Xavier (fundadora de Criola); Gilmara Cunha (fundadora de Conexão G); Lígia Batista (diretora do Instituto Mariele Franco); Iracema Souza (gerente de conhecimento e advocacy do Fundo Agbara); com abertura de Luyara Franco (Diretora do Instituto Mariele Franco) e mediação de Dandara de Paula (coordenadora de programas do Instituto Mariele Franco), trouxe provocações sobre o quanto a democracia como está dada nos tempos atuais não contempla a cidadania das mulheres negras, além de sua incapacidade de garantir a existência das mulheres negras trans. Além disso, aprofundando o debate para a dimensão da participação social, foi levantado a partir dos dados da pesquisa Diagnóstico acerca de Filantropia e Raça: do centro das lutas às margens dos recursos reflexões sobre a escassez de recursos se configura como obstáculos do racismo institucional para a garantia da participação política das organizações de mulheres negras. O evento foi realizado no auditório da Open Society Foundations, com transmissão online, e reuniu cerca de uma centena de pessoas.

No dia seguinte, atravessamos da costa leste para a costa oeste do país, e aterrissamos no Global Summit of Collaborative Funds, um evento internacional que reuniu cerca de 350 pessoas, entre doadores e fundos colaborativos para compartilhar e aprender sobre as práticas do financiamento colaborativo. O evento ocorreu em San Francisco, entre os dias 12 e 14 de março, e estivemos presentes através de Aline Odara, diretora executiva do Fundo Agbara, e Iracema Souza, Conhecimento e Advocacy do Fundo. Nossa incidência consistiu em trocas face a face com lideranças de diferentes organizações, participação ativa nos grupos de discussão e manuseio dos nossos materiais de disseminação da pesquisa. Foi uma excelente oportunidade para enfatizar a importância da democratização dos recursos para mulheres negras, considerando a interseccionalidade de raça e gênero, assim como evidenciar a importância da autonomia das organizações na gestão desses recursos.
Por último, seguimos os quase 5 mil quilômetros de volta para New York para a realização do nosso segundo evento paralelo Mulheres Negras do Sul Global Movendo o Mundo na CSW69, idealizado e realizado em parceria com o CEERT, Amma Psique e Negritude, co-realização da W20 Brasil e com apoio do Kilomba Collective, Brazil Foundation e W20 África do Sul.
O evento internacional teve como proposta a construção de um espaço de trocas de saberes que estavam além da fala, mas também da experiência audiovisual e sensorial. Iniciou-se com a exibição do documentário Do centro das lutas às margens dos recursos, realizado pelo Fundo Agbara como parte da pesquisa Diagnóstico. Seguiu-se por uma mesa de debate mediado por Iracema Souza (Fundo Agbara), com participação de Sibulele Poswayo (W20 África do Sul), Giselle dos Anjos (CEERT) e Kamila Camilo (W20 Brasil) as quais se debruçaram sobre a relevância da atuação das mulheres negras frente aos desafios impostos pelos eventos climáticos extremos e em prol da justiça climática, além de refletir sobre as barreiras que se impõem a estas organizações ao acesso a recursos para essas pautas. O evento também contou com a mediação de momentos de autocuidado e bem viver com a Clélia Prestes da Amma Psique e Negritude.
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